6 de agosto de 2005

Marasmo - Avenida da Estação - Parte 4 (e última)

A Saga da Avenida (conclusão)

Terminei o capítulo anterior, referindo o protocolo de colaboração entre o Governo e CMM homologado em 22.06.2000 pelo Ministro Jorge Coelho.
Como está bem patente, esse protocolo não foi honrado pelo governo.
Entretanto, surgiram desenvolvimentos. Num deles, o IEP lembrou-se de avançar com uma alternativa para a circular Sul de Mangualde, continuação da Estrada Nacional N.º 232. Em vez de utilizar a “nossa” Avenida da Estação, a circular partiria logo após a passagem inferior ao caminho de ferro, inflectindo para poente e contornando Cubos, para ir ter ao cruzamento de Pedreles e ao futuro nó de ligação ao IC12, junto ao “vale da Choca”. Esta alternativa teve resposta da Câmara, a qual iniciou os contactos com os proprietários dos terrenos a ocupar pelo novo traçado, procedimentos necessários para o processo expropriativo. Contudo, logo eclodiu um “movimento de geração espontânea” que incluía diversos proprietários, os quais se opunham à solução. Isto é, viam com bons olhos a iniciativa, mas defendiam que o traçado não devia ser o preconizado pelo IEP. “Rua sim, mas ali pela do vizinho...”.
Entretanto, o tempo foi passando com a inexorável degradação do pavimento da Avenida. A Câmara ia reparando uns buracos aqui e além, num afã de minorar os inconvenientes, mas, todavia, consciente de que se tratava de meros paliativos. E, como é bom de ver, continuou a pressionar o Governo.
Cabe aqui uma palavra para referir que, entretanto, o Eng. Guterres abandonou o “pântano” (como lhe chamou) e fomos a eleições. Aí, a coligação PSD/PP conquistou a maioria e formou governo. Só que o tal “pântano” ainda era mais insalubre do que se temia. E, assim, fomos obrigados a seguir uma política de contenção, austeridade e rigor, liderada por Manuela Ferreira Leite. Os cortes orçamentais sucederam-se, e os estádios do Euro, bem como as SCUT’s, absorveram a maioria do investimento público.
Desta forma, goraram-se as expectativas de conseguir resolver o problema da avenida, na configuração delineada no protocolo de 2000. O IEP, seguindo orientações superiores, passou a transmitir a ideia de que não seria possível realizar a obra. Contudo, depois de muito porfiar, o Presidente conseguiu que o IEP assinasse um novo protocolo, ou melhor, uma adenda (alteração) ao de 2000. Foi essa adenda que foi presente à célebre reunião da Câmara de 18 de Outubro de 2004, da qual aqui vou transcrever o excerto da acta que contém a matéria em apreço.
Não vou colocar o “pdf”, dados os problemas que alguns leitores sentiram para realizar o download dos anteriores.

MUNICÍPIO DE MANGUALDE
CÂMARA MUNICIPAL
ACTA Nº 19/2004
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INSTITUTO DE ESTRADAS DE PORTUGAL - ADENDA AOS PROTOCOLOS CELEBRADOS COM A CÂMARA MUNICIPAL DE MANGUALDE REFERENTES À BENEFICIAÇÃO DA VARIANTE SUL QUE LIGA À EN 232 E À BENEFICIAÇÃO DA EM 595 QUE ESTABELECE A LIGAÇÃO ENTRE A EN 234 E A EN 231 - PROCESSO S-6/2

Foi presente um ofício do IEP - Instituto de Estradas de Portugal, remetendo a seguinte adenda aos Protocolos celebrados com esta Câmara Municipal, referentes à beneficiação da Variante Sul que liga à EN 232 e à beneficiação da EM 595 que estabelece a ligação entre a EN 234 e a EN 231:
"Protocolo - Adenda
Considerando que:
- A não existência de uma via nacional que suporte o tráfego de passagem entre a EN 234 e a EN 232, e que o mesmo se efectua através de uma via municipal designada por Av. dos Montes Hermínios;
- O disposto no Decreto-Lei n.° 384/87, de 24 de Dezembro, no qual se preconiza a cooperação técnica-financeira entre a administrativo central e as autarquias locais, no desenvolvimento regional e local;
- Devido a iniciativa e disponibilidade da Câmara Municipal de Mangualde em iniciar processo de candidatura da obra para efeitos de financiamento comunitário, face a urgência em iniciar procedimentos inerentes a beneficiação dos referidos lanços de estrada e não se verificando o cumprimento do disposto em várias cláusulas dos protocolos homologados em 07 de Novembro de 1997 e 22 de Julho de 2000, torna-se necessário celebrar uma adenda aos citados protocolos.

A Câmara Municipal de Mangualde, daqui em diante designada por CMM, representada neste acto pelo seu Presidente, António Soares Marques, e o Instituto das Estradas de Portugal, daqui em diante designado por IEP, com sede na Praça da Portagem, em Almada, representado neste acto pelo seu Presidente, José Manuel Rosado Catarino, celebram a presente adenda aos protocolos homologados respectivamente, em 07 de Novembro de 1997 e 22 de Julho de 2000 a qual rege-se pelas cláusulas seguintes:
1. O objecto da presente adenda, aos protocolos homologados em 07 de Novembro de 1997 e 22 de Julho de 2000, consiste:
Na beneficiação da Variante Sul que liga a EN232, interrompida pelo fecho da PN da CP no valor de 750.000 € (setecentos e cinquenta mil euros) e;
Na beneficiação da EM 595, que estabelece a ligação entre a EN234 e a EN231, no montante de 1.500.000 € (um milhão e quinhentos mil euros), lanços classificados no PRN 2000 como municipais.
2. A CMM responsabiliza-se pela elaboração dos estudos e do projecto, assim como pelas expropriações eventualmente necessárias, obtendo os pareceres, as licenças, as autorizações técnicas ou de qualquer outra natureza, com respeito pelos procedimentos previstos, e praticara todos os demais actos legalmente exigidos aos níveis nacional e comunitário.
3. A CMM assume-se como dona da obra, competindo-1he lançá-la, geri-la e executá-­la desde a fase do anúncio do concurso até á sua conclusão, cabendo-lhe a responsabilidade pela execução material, financeira e contabilística da obra e, neste âmbito, nomeadamente e sem prejuízo das demais, as seguintes funções:
a) Tomar iniciativas conducentes a abertura do concurso para a adjudicação da obra;
b) Fiscalizar a execução dos trabalhos;
c) Elaborar autos de medição dos trabalhos executados e, uma vez devidamente verificados, aprovados e visados, proceder aos correspondentes pagamentos ao empreiteiro;
d) Elaborar a conta final;
e) Proceder a recepção provisória e definitiva da obra;
f) Praticar todos os demais actos legalmente previstos.
4. A CMM assume também a responsabilidade contratual ou extra-contratual emergente de quaisquer actos ou omissões que se enquadrem nos seus poderes de gestão pública ou de gestão privada, perante o IEP, e/ou quaisquer terceiros, relacionados directa ou indirectamente com o presente protocolo.
5. A CMM preparara, em estreita colaboração com o IEP, o processo de candidatura da obra objecto do presente protocolo, a Medida 3.12 do Eixo 3 do Programa Operacional da Região Centro, para efeitos de financiamento comunitário, assumindo-se como entidade beneficiária do projecto, sendo o valor máximo elegível de 2.250.000 € (dois milhões, duzentos e cinquenta mil euros) e a comparticipação máxima FEDER de 1.125.000 € (um milhão, cento e vinte e cinco mil euros).
6. A componente nacional do investimento a efectuar com a obra objecto do presente protocolo será assumida pela CMM.
7. A CMM dispõe do prazo de 10 (dez) dias, contados a partir da solicitação do envio de documentos e/ou prestação de esclarecimentos pelo IEP, para lhe remeter os solicitados documentos e/ou para lhe prestar os esclarecimentos necessários e convenientes a instrução e ao acompanhamento do processo de candidatura a financiamentos comunitários.
8. O presente protocolo vigora desde a data em que seja homologado pelo Senhor Secretario de Estado das Obras Publicas, e termina trinta dias após a obra ser considerada concluída pelas partes.
9. A vigência do presente protocolo poderá ser prorrogada pelo IEP por motivos fundados em circunstâncias excepcionais, mediante pedido fundamentado apresentado pela CMM ao IEP.
10. Na execução do presente protocolo e na interpretação das suas clausulas deve atender-se a letra e ao espírito do PRN 2000, excluindo-se expressamente a disciplina relativa a transferência de atribuições e competências para os municípios, assim como das correspondentes verbas.
11. Este protocolo não está sujeito a fiscalização prévia do Tribunal de Contas, por se enquadrar na alínea e) do artigo 470 da Lei n.° 98/97, de 26 de Agosto.
12. As dúvidas que porventura surjam na interpretação e aplicação do presente protocolo serão resolvidas por despacho do Senhor Secretario de Estado das Obras Publicas."

Após os esclarecimentos prestados pelo Senhor Presidente, procurando justificar a presente decisão foram trocadas impressões entre todos os membros do Órgão Executivo.
A este propósito o Senhor Vice-Presidente da Câmara, Dr. Castro de Oliveira, disse não estar de acordo com a homologação da presente adenda aos referidos protocolos, tendo apresentado a seguinte análise da situação e proposta de decisão:
"Da leitura da ‘Adenda ao protocolo’ verifica-se ser óbvio que quem não cumpriu, até ao presente, com as alíneas existentes nos protocolos anteriores foi o IEP.
Analisando os quadros que se seguem, dos vários cenários possíveis, verifica-se ter o IEP, de uma forma habilidosa, transferido para a Câmara Municipal de Mangualde, as responsabilidades financeiras e técnicas que lhe competiam, na base dos protocolos que livremente assumiu e assinou e que, em devido tempo, mereceram a homologação do poder político (Secretário de Estado e Ministro).
Quadros dos cenários possíveis:

(na acta seguem-se 4 quadros, correspondentes a outros tantos cenários, que aqui não coloco porque não sei fazer tabelas no meu blog, e também porque não são essenciais para a compreensão do processo, como se verá)

Nesta conformidade, com base na análise dos quadros, a alteração aos protocolos existentes através da assinatura da adenda em causa, traduzir-se-á numa situação extrema de vantagens para o IEP e de desvantagens para a CMM. O IEP efectivamente e na prática deixa de ter responsabilidades financeiras e de execução da obra, transferindo-as, integralmente, para a CMM que as passa a assumir e decorrendo, assim, prejuízos muito elevados para o erário público municipal da seguinte ordem de valores:
Se a Variante Sul custar 750.000 € (setecentos e cinquenta mil euros) a CMM perderá com o negócio entre um mínimo de 375.000 € (trezentos e setenta e cinco mil euros) e um máximo de 750.000 € (setecentos e cinquenta mil euros).
Se a Variante Sul custar os 1.125.000 € (um milhão cento e vinte e cinco mil euros) previstos inicialmente a CMM perderá com o negócio entre um mínimo de 750.000 € (setecentos e cinquenta mil euros) e um máximo de 1.125.000 € (um milhão cento e vinte e cinco mil euros). Face ao exposto, entende-se que a CMM não pode, em consciência, aprovar esta adenda aos protocolos o que, nas circunstâncias e face ao que lhe é proposto, determina a não ratificação da opção assumida pelo Presidente da Câmara (que a ser ratificada se constituiria como óbvia delapidação do erário público Municipal que temos obrigação legal e estrita de defender), havendo tão somente, que obrigar o IEP a cumprir, com a maior urgência e sem manobras dilatórias, os protocolos homologados respectivamente em 7 de Novembro de 1997 e em 22 de Junho de 2000."

No final da discussão, a Câmara não tomou qualquer posição relativamente à proposta apresentada pelo Senhor Vice-Presidente, e deliberou homologar a presente adenda aos Protocolos celebrados com esta Câmara Municipal, referentes à beneficiação da Variante Sul que liga à EN 232 e à beneficiação da EM 595 que estabelece a ligação entre a EN 234 e a EN 231.
Votaram contra, o Senhor Vice-Presidente, Dr. Castro de Oliveira, e o Senhor Vereador Eng.º Luís Fraga.
Abstiveram-se nesta deliberação, os Senhores Vereadores eleitos pela lista do Partido Socialista, Dr. Mário de Figueiredo e Dr. João Azevedo.
Votaram favoravelmente, o Senhor Vereador Eng.º Agnelo Figueiredo e o Senhor Presidente da Câmara, tendo este, face ao empate de votação verificado, usado do seu voto de qualidade.
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Temos, então, o seguinte:

  • O IEP, efectivamente, transferiu para a Câmara toda a responsabilidade pelo projecto, execução e pagamento das obras (Avenida da Estação e Estrada desde a Zona Industrial até ao limite do Concelho, passando por Pedreles e Cruzeiro da Lama);
  • Estas obras custarão, no conjunto, 2.250.000€;
  • O IEP aceitou incluí-las no Programa Operacional da Região Centro e, assim, permitir que sejam financiadas pelo FEDER em 50%;
  • Resultando para a Câmara uma despesa de 1.125.000€ (225.000 contos);
  • Despesa que não teria se o IEP cumprisse o acordo de 2000, homologado pelo ministro Jorge Coelho.

Quanto às posições políticas dos vereadores, reconhece-se o seguinte:

  • Os do CDS votaram contra por considerarem que a Câmara deveria obrigar o IEP a cumprir o acordo anterior;
  • Os do PSD votaram a favor por acharem que os Mangualdenses não devem continuar "à espera", "castigados" pela falta de cumprimento de acordos por parte do Governo, ainda que isso custe dinheiro;
  • Os do PS abstiveram-se. Tanto lhes faz…

FIM

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